5.1.14

Pausa

Postado por Marcus Vinicius Alves |

Após muito tempo com o blog parado posto este texto para avisar que ele agora está oficialmente interrompido por tempo indeterminado. Muita pesquisa, muito trabalho e muitos escritos extras tomaram meu tempo e me afastaram dos textos daqui.  

Não apagarei os textos nem o blog, pois mesmo sem escrever com periodicidade ele ainda recebe uma quantidade razoável de visitas diárias, vindas de outros blogs que linkaram os textos daqui. Além disso, talvez um dia eu volte a escrever aqui (ou use para alguma outra atividade, quem sabe?), por enquanto, vou publicando em outros lugares. Agora postarei apenas no blog Prisma Científico, que por ter um escopo mais amplo, me permite falar de tópicos além da psicologia (mas também escreverei sobre psicologia lá).

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PRISMA CIENTÍFICO

31.1.13

Texto InterCiência: Procrastinação

Postado por Colaboradores |


Há alguns dias, o pessoal do Science Blogs resolveu fazer uma pequena brincadeira chamada "InterCiência".

Entrei na brincadeira com o CogPsi e hoje publico o texto que recebi de presente do meu 'blogueiro oculto', com vocês:

Procrastinação, ou o porquê desse post estar dois dias atrasado.

Se seu professor de Cálculo II perguntasse, no fim do semestre, se você prefere entregar seus trabalhos uma vez por semana até o último dia de aula; ou dois na primeira semana e o outro na segunda semana; ou todos na última semana de aula, o que você escolheria? Ou você quer entregar todos na primeira semana e se ver livre do problema? Só há uma condição: uma vez que você escolha uma opção, não pode mudar de ideia no meio do caminho...

Se você pensar bastante – mas bastante mesmo – sobre o problema, vai chegar à conclusão de que escolher entregar tudo no último dia de aula parece a solução mais racional, já que assim vai ter mais tempo para preparar os trabalhos. Ou, se você se acha esperto o bastante, poderia escolher entregar tudo logo de uma vez e passar as duas últimas semanas de aula numa boa, aproveitando todas as festas de encerramento de semestre. A pergunta que resta é se suas notas serão melhores em uma ou em outra condição.



Em 2002, Klaus Wertenbroch and Dan Ariely conduziram uma pesquisa para saber exatamente isso. Três turmas diferentes tinham três esquemas de entrega de trabalhos nas três últimas semanas de aula. A primeira turma entregaria os três trabalhos no último dia de aula, a segunda poderia escolher entre as três modalidades (entregar tudo na primeira semana, entregar um trabalho por semana, ou entregar tudo no último dia), e a terceira turma teria que entregar um trabalho por semana. As melhores notas foram para os alunos da turma que entregou um trabalho por semana, e as piores notas para aqueles que entregaram os trabalhos na última semana. Mesmo entre a turma que podia escolher seu esquema de entrega de trabalhos, as melhores notas foram para aqueles que escolheram entregar um trabalho por semana. A explicação é óbvia para qualquer um que já passou pelo primeiro semestre da faculdade: a gente sempre deixa tudo para a última hora.

Aqueles que não tiveram a opção de escolher e foram forçados a entregar um trabalho por semana e aqueles que foram honestos o suficiente – ou pelo menos conseguiam entender seu próprio comportamento – para escolher o esquema de entrega semanal se deram muito melhor do que os que se acharam espertões e escolheram o último dia para entregar tudo.

"... aqueles que reconhecem e admitem sua fraqueza estão em uma posição melhor para utilizar as ferramentas disponíveis para comprometerem-se e, ao fazê-lo, acabam colaborando para o próprio sucesso." (Dan Ariely, "Previsivelmente Irracional".)

Procrastinar é como uma compulsão, algumas pessoas simplesmente não conseguem resistir. Outra maneira de pensar sobre o comportamento de procrastinar é lembrar que o que você sabe que quer AGORA pode não ser exatamente aquilo que você vai querer amanhã. Todo começo de ano todo mundo quer sinceramente-do-fundo-do-coração fazer dieta e frequentar a academia. Mas na segunda-feira, está chovendo, e além do mais eu mereço uma barra de chocolate, e tá passando Goonies na sessão da tarde, e... blablablá.



A única maneira de lidar efetivamente com a procrastinação é resignar-nos ao nosso destino de vagabundos irremediáveis e aceitarmos que, em condições normais de temperatura, pressão e data de entrega do relatório, nós vamos deixar tudo para a última hora. Sim, a primeira regra do AA vale até pra isso: aceitar que você tem um problema é o primeiro passo. Depois disso, é preciso aprender a estabelecer metas realistas para si mesmo. Saber quais são os seus limites e distribuir pequenos incentivos ao longo do caminho também costuma facilitar a tarefa. Todo mundo que já participou de algum programa do Vigilantes do Peso sabe como aquele brigadeiro no fim da semana ajuda a manter a sanidade mental e traz paz na terra ao homens de boa vontade. E deixar de se achar mais esperto que os outros também ajuda bastante.

No final das contas – e dos prazos – tente não se descabelar muito e aceite que perder uma noite de sono de vez em quando não vai matar ninguém. Planejar, pedir ajuda aos universitários, amigos, parentes e colegas de república; usar aplicativos que planejam seu tempo ou que impedem o acesso ao Facebook/Twitter/Tumblr; ou simplesmente colocar o celular para tocar meia hora antes da academia fechar também não é nenhuma vergonha. E, lembre-se sempre do sábio provérbio: antes tarde do que mais tarde.


[Este texto é parte da primeira rodada do InterCiência, o intercâmbio de divulgação científica. Saiba mais e participe em: http://scienceblogs.com.br/raiox/2013/01/interciencia/]

Referências:
Ariely, D., & Wertenbroch, K. (2002). Procrastination, Deadlines, and Performance: Self-control by Precommitment. Psychological Science, Vol. 13(3), 219-224.
Dan Ariely. (2010). "Predictably Irrational, Revised and Expanded Edition: The Hidden Forces That Shape Our Decisions". Harper Perennial.

24.10.12

Prisma Científico

Postado por Marcus Vinicius Alves |

Há algum tempo atrás fui convidado por amigos para participar de um blog de ciência, hoje esse blog tem crescido bastante e com o tempo e concorrência de outras várias atividades, o Cogpsi tem ficado um pouco mais parado do que deveria (eu sei, eu sei!).

Porém outros textos já estão sendo escritos, inclusive mais um da série "Quem tem medo de estatística" com o André Souza do Cognando e "Psicologia Brazuca" com o André Rabelo do Socialmente.

Por enquanto, convido você, leitor do Cogpsi, a visitar o blog Prisma Científico.

Aqui vai uma descrição da nossa proposta:

"Escrever nossas ideias sempre nos pareceu uma maneira sensata de fixá-las e, com tempo e dedicação, agir de maneira concreta a colocá-las em prática. Depois de muita reflexão e discussão com alguns colegas (hoje parceiros nessa empreitada), conseguimos tirar a ideia de seu mundo (como diria Platão) e trazê-la ao papel. Na verdade ao papel não, afinal a tecnologia já nos dominou há algum tempo. Trazer nossas ideias para este blog! E dividir! Afinal o que não é transmitido e retransmitido não perdura.

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.O Prisma Científico é uma vontade de sete amigos em escrever sobre ciência de maneira translúcida e acessível, em criar conteúdo, discuti-lo, adicionar sete comprimentos de onda no espectro das perspectivas correntes, e com a possibilidade de deixar emergir diversas frações de ideias. Deixando-as registradas, garantimos o funcionamento de nossa própria memória para não as abandonar.
.Convidamos você a refratar conosco!"
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Nesse blog, além da ciência psicológica, consigo abordar a ciência em geral e até literatura, filosofia e música, o que não acontece muito no Cogpsi, até agora seis textos meus foram publicados lá, confira:



E aqui os links para curtir o Prisma e o Cogpsi no facebook e no twitter:


COGPSI
  


PRISMA CIENTÍFICO


Maria Emília Yamamoto pode ser considerada uma das “mães” da psicologia evolucionista brasileira. Pioneira na área, ela hoje é professora na Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN) e tem participação fundamental na promoção e no desenvolvimento da psicologia brasileira, especialmente da psicologia evolucionista (PE). Ela editou em co-autoria com a professora Maria Seidl o livro Psicologia evolucionista, primeiro manual brasileiro da área.
Assim como o Dida, a Maria Emilia veio da etologia, mas sua carreira foi se direcionando cada vez mais também para a PE. A professora Maria Emilia se tornou uma porta-voz da área e tem divulgado o seu trabalho em diversos congressos, palestras e eventos. Ela gentilmente nos cedeu uma entrevista rica, na qual foram discutidos diversos assuntos que ela, assim como muitos pesquisadores no mundo todo, tem tentando relacionar na sua pesquisa, como a evolução, a prosocialidade, a religião e a moralidade.

Maria Emilia, você pode nos contar um pouco sobre os projetos de pesquisa que você está desenvolvendo em seu grupo de pesquisa atualmente e sobre os projetos que estão a caminho?
Meu principal interesse de pesquisa é o comportamento cooperativo sob uma ótica evolucionista. Investigo os moduladores desse comportamento, principalmente sob o ponto de vista próximo. Entre esses moduladores encontram-se, principalmente, as variáveis sociais, como a influência de grupos de pertinência, a vigilância, a ocorrência de punições e sanções, a trapaça. Há muitos anos a Psicologia vem mostrando que nós, humanos, somos não apenas animais sociais, mas também animais grupais. Por essa razão, é fácil induzir o favorecimento de grupos com os quais nos identificamos e a hostilidade em relação àqueles que consideramos como rivais. Nossas pesquisas e aquelas de outros pesquisadores sugerem que essas predisposições têm suas raízes em nosso passado ancestral, que favoreceu a aptidão daqueles que as possuíam. Atualmente, embora o ambiente seja muito diferente daquele experimentado por nossos ancestrais, várias dessas predisposições permanecem e influenciam nosso comportamento. Em função de nossa predisposição em nos filiarmos a grupos, os marcadores sociais associados a eles, sejam os de escolha, como religião, time de futebol, ou aqueles próprios ao indivíduo, como etnia e naturalidade, afetam nossas escolhas de parceiros de associação e cooperação.
Uma questão anterior àquela da associação diz respeito à classificação que fazemos dos indivíduos e que resulta na atribuição de pertinência a grupos. Estamos trabalhando essa questão usando a variável etnia e contrapondo-a à questão de coalizão de grupo, e nossos resultados até o momento sugerem que a composição étnica e social do local em que as pessoas vivem afetam essa classificação.
Ainda no tema de comportamento pró-social, avaliamos a cooperação com o grupo em crianças, em situação de jogos públicos. Investigamos a influência de variáveis tais como tamanho de grupo, vigilância e feedback positivo e negativo no comportamento pró-social.
Outro tema que investigamos bastante até alguns anos atrás e estamos retomando é o do comportamento alimentar. O que comemos é fortemente influenciado pelo nosso passado evolutivo, caracterizado por escassez ou, pelo menos, irregularidade da disponibilidade de alimentos. Essas condições deram oportunidade para um tipo de comportamento que Rozin chama do dilema do onívoro, que consiste na relutância em experimentar alimentos novos, pois alimentos novos no nosso passado ancestral podiam ser tóxicos, mas, por outro lado, a tentação de incorporar novos itens à dieta, frente à escassez regular ou sazonal de alimentos. Atualmente, a probabilidade de ingerirmos alimentos tóxicos entre os disponíveis é muita baixa, mas muitos indivíduos apresentam uma reação neofóbica a alimentos não familiares, e recusam-se a ingeri-los. Investigamos quais as condições que favorecem essa reação e quais a atenuam. Ainda dentro do comportamento alimentar, a obesidade é um comportamento frequente e induzido, entre outros fatores, por nossa tendência a preferir alimentos calóricos, principalmente aqueles ricos em gordura e açúcares, novamente uma predisposição moldada em ambientes nos quais esses tipos de alimentos eram escassos. É claro que hoje, com supermercados à disposição isto não é mais verdade, e a facilidade em conseguir esse tipo de alimentos resulta em obesidade e em doenças que Nesse e Williams chama de doenças da civilização. Estamos retomando esta linha atualmente com o objetivo de investigar o craving, e seus fatores desencadeantes.
Como o altruísmo faz sentido a partir da ótica evolucionista? Não seria evolutivamente mais vantajoso agir apenas em nosso favor?
Esta foi uma questão que preocupou tanto ao Darwin, que ele chegou a acreditar que ela seria o fim de sua teoria. Ela começou a ser resolvida por Hamilton, que propôs a seleção de parentesco, que diz que ajudamos nossos parentes porque isto equivale, dependendo de quantos parentes são ajudados e de nosso grau de parentesco com eles, a ajudar a nós mesmos. Isto acontece porque, do ponto de vista evolutivo, quando falamos em altruísmo estamos nos referindo a capacidade de passar nossos genes para a próxima geração. Portanto, podemos ser altruístas do ponto de vista moral (ou próximo) e ao mesmo tempo egoístas do ponto de vista evolutivo (ou distal). É o que acontece quando ajudamos nossos parentes.
Mais tarde, Trivers apresenta a hipótese do altruísmo recíproco, que explica o comportamento altruísta dirigido a não parentes. Segundo esta teoria, em espécies com longo tempo de vida e boa capacidade de memória, como é o caso dos humanos, haveria a possibilidade de prestar favores a indivíduos não aparentados na expectativa de uma retribuição futura. A capacidade de memória nos permitiria lembrar e reencontrar nossos devedores, e o longo tempo de vida, oportunidades de cobrar nossas dívidas. Dessa maneira, como na seleção de parentesco, ao ajudar outros estaríamos ajudando a nós mesmos.
Porém, nem só da retribuição direta vive o homem. Na realidade, vivemos em grande parte de nossa reputação, ou do altruísmo indireto, que nada mais é do que praticar uma boa ação na frente de uma audiência interessada. Vários estudos têm demonstrado (dentre os quais os excelentes trabalhos de Milinski) que ao exibir nossa boa vontade e disposição para cooperar, atraímos a boa vontade e a cooperação de outros, que reagem a nossa boa reputação.
É importante destacar que a maior parte dessas ações não são planejadas de forma maquiavélica ou calculista. Embora alguns indivíduos possam se aproveitar de nossa tendência a cooperar com parentes, a retornar favores e boas ações ou a cooperar com aqueles que temos em alta conta, na maior parte das vezes agimos assim porque consideramos que essa é a maneira correta de agir. Ou seja, seguimos predisposições que foram selecionadas durante nosso passado evolutivo e reforçadas pelas regras da vida social, razão pela qual somos o que Wright chama de animais morais. Ao agir dessa forma, ao nos comportarmos altruisticamente, favorecemos outras pessoas, somos éticos, mas também aumentamos as chances de sermos, nós mesmos, os receptores do altruísmo de outros. Portanto, nosso altruísmo é em grande parte egoísta, do ponto de vista biológico.
Alguns autores argumentam que a religião, e que, em especial, os rituais religiosos, surgiram, entre outros motivos, como uma solução para o problema social da não cooperatividade (e.g. trapaceiros), como os proponentes da teoria da sinalização dispendiosa (costly signaling theory). Nesse sentido, qual é a relação entre a religião e a cooperação?
Há dois argumentos, na abordagem evolucionista, para o aparecimento da religião na espécie humana: a hipótese adaptacionista, descrita em sua pergunta, e a hipótese do spandrel, que sugere que a religião é um subproduto da mente evoluída.
A primeira hipótese faz todo sentido, pois uma das questões mais complicadas da vida social, até hoje, é evitar que outros se aproveitem de sistemas sociais que deveriam beneficiar apenas seus membros. Uma boa parte das normas sociais, até os dias atuais é dedicada a estabelecer obrigações e prever punições aos que não as cumprem. Nossos ancestrais provavelmente tiveram que lidar com esses mesmos problemas e a religião pode ter cumprido uma função adaptacionista ao estabelecer rituais de entrada e de manutenção tão custosos, que só valeria a pena cumpri-los caso houvesse um real comprometimento. Trapaceiros evitariam passar por experiências dolorosas ou de privação incluídas nesses rituais, e isto permitiria selecionar aqueles que realmente estariam identificados com o grupo.
A segunda hipótese sugere que a religião é um subproduto do crescimento exacerbado do cérebro humano, que deu margem ao desenvolvimento de mecanismos que favoreceriam o desenvolvimento de explicações sobrenaturais. Mais especificamente, Pascal Boyer, em seu livro Religion Explained, sugere o desenvolvimento de mecanismos tais como: o de detecção de agentes, que levaria a imaginar agentes por trás de eventos difíceis de ser explicados, como relâmpagos e trovões, e à proposição de suas causas a agentes sobrenaturais; à melhor memória para eventos minimamente contra intuitivos, o que estaria de acordo com deuses antropomórficos à semelhança dos humanos, porém mais poderosos; e mecanismos de prevenção de perigo, que poderiam ter levado ao desenvolvimento de rituais religiosos como forma de prevenir males futuros.
Evidências têm sido obtidas para as duas hipóteses, porém não foi possível, até o momento, descartar nenhuma delas. Fala a favor da hipótese adaptacionista o fato de que grupos religiosos, especialmente aqueles que são mais estritos e/ou minoritários, demonstrarem alto grau de cooperação entre seus membros. Porém, outros grupos, não religiosos, também mostram disposição para cooperar, até mesmo grupos não estruturados, como o de ateus.
Portanto, existe claramente uma relação entre religião e cooperação, porém essa relação não é universal. Há grupos religiosos mais “frouxos”, nos quais a pertinência ao grupo não age necessariamente como referência para seus seguidores, e, por outro lado, há grupos não religiosos que mostram essa disposição, como grupos políticos (a história recente da União Soviética seria um exemplo interessante de analisar).
Prefiro pensar que a religião e cooperação estão relacionadas, da mesma maneira como a cooperação pode ser favorecida em outros grupos, não religiosos. Isto fala muito mais a favor de, como espécie, mostrarmos uma tendência a fazer parte de grupos do que a sermos religiosos.
Você tem investigado recentemente alguns aspectos relacionados à moralidade, à formação de grupos e à cooperação em crianças. Você poderia comentar um pouco sobre essa sua pesquisa e sobre como estes fenômenos sociais interagem?
Desde que a Psicologia começou a se interessar pelo comportamento moral a questão de quando ele aparece, durante o desenvolvimento, esteve presente. Somos naturalmente morais ou aprendemos a nos comportar moralmente? Na realidade, estudos recentes sugerem que as duas coisas acontecem. Os trabalhos de Paul Bloom, Karen Wynn e sua equipe na universidade de Yale, mostram que existe um senso moral desde muito cedo. Dois pontos a destacar aqui: primeiro, isto é muito diferente do que a Psicologia tradicional tem afirmado sobre o desenvolvimento da moralidade, sugerindo que nascemos animais amorais (ver, por exemplo, Piaget e Kohlberg); em segundo lugar, estas descobertas poderiam sugerir que a socialização não é importante no desenvolvimento da moralidade. Na realidade, como eu havia mencionado antes, os dois aspectos se complementam.
Todos, independente do tipo de criação que recebemos ou da cultura na qual vivemos, temos, desde muito cedo, algum senso do certo e do errado, do justo ou do injusto. No entanto, a cultura e a criação constroem sobre e modelam esta nossa predisposição. A moralidade, tal como a conhecemos e que a maioria de nós exerce, é uma síntese de predisposições biológicas e da socialização. Ela está solidamente fundada em um aparato básico que faz com que os bebês, nos estudos citados acima, prefiram os bichinhos e objetos que ajudam e são gentis em relação aos que atrapalham ou são maus. Mas a moralidade é mais do que isso – ela também é o produto da nossa cultura e de normas que são comunitariamente acordadas.
Nesse sentido, o que entendemos por comportamento moral ou altruísta na perspectiva evolucionista, pode ser bastante diverso daquilo que se chama comportamento moral em outras áreas ou disciplinas. Estamos interessados nos impactos desses comportamentos sobre a aptidão individual, e por essa razão, comportamentos que são genuinamente morais ou altruístas do ponto de vista ético podem não o ser do ponto de vista evolutivo. Crianças e outros indivíduos indefesos ou desprotegidos são frequentemente o alvo de comportamentos de ajuda e solidariedade. Crianças, principalmente aquelas que parecem mais desprotegidas, fracas ou aquelas que têm características infantis mais pronunciadas, frequentemente induzem comportamentos de ajuda e proteção. Porém, isto acontece principalmente quando o protetor é um adulto. Resultados iniciais de um estudo que estamos desenvolvendo sugerem que crianças mais velhas não se mostram tão complacentes em relação a crianças mais jovens. Portanto, este é um padrão de comportamento que se desenvolve ao longo da vida e sofre o efeito da socialização, como enfatizei acima.
Investigamos também se crianças de 6 a 11 anos cooperavam com seu grupo, abrindo mão de uma recompensa imediata em favor de uma recompensa maior mais tarde. Descobrimos que elas tem maiores chances de fazer isto quando algumas circunstâncias estão presentes, como um grupo pequeno e mais vigilante, umfeedback relativo ao comportamento do grupo, entre outras. Tal como adultos, crianças avaliam as condições presentes, e decidem qual a melhor estratégia.
Finalmente, investigamos também o efeito do grupo de pertinência sobre a generosidade. Vimos que grupos religiosos ou ateus tendem a ser mais generosos com seu pares, e igualmente generosos (ou pouco generosos) com outros indivíduos. A ideia de fazer o bem sem olhar a quem, tão cara a algumas religiões, não parece se manter – fazer o bem sim, porém com uma seleção muito cuidadosa de quem recebe o benefício. Este é um comportamento de favorecimento do grupo, bastante estudado em psicologia social. Acrescentamos uma explicação mais ampla, baseada no modo de vida ancestral, quando nossos ancestrais dependiam de seu grupo para sobrevivência e temiam estranhos. Considero que esta abordagem complementa as explicações dadas pela psicologia social, inserindo na equação as predisposições biológicas, que irão modular a expressão do comportamento.
Como surgiu o seu interesse pela sua área de pesquisa?
Fiz minha formação pós-graduada na área de comportamento animal. Meu interesse pelo estudo do comportamento animal foi despertado ainda na graduação. Trabalhei muitos anos com saguis, peixes e golfinhos. Na realidade, as perguntas que fazemos em relação aos humanos, na abordagem evolucionista, são as mesmas que fazemos para as outras espécies. Claro que há, eu não diria complicadores, mas especificidades. Folley diz que somos apenas mais uma espécie única, e eu não poderia concordar mais. Pelo fato de ser psicóloga e orientar vários psicólogos, a ampliação de minha área de trabalho incluindo humanos foi uma coisa natural. Continuo até hoje interessada em estudar saguis, que são animais extremamente interessantes, e faço também alguns trabalhos com peixes.
É difícil ser um pesquisador em psicologia no Brasil?
Esta resposta é necessariamente comparativa. Eu vivi os anos difíceis da pesquisa no Brasil, quando os recursos eram poucos e o trabalho, principalmente na área de humanas e sociais, pouco valorizado. Hoje temos recursos, temos laboratórios temos reconhecimento e, principalmente, temos uma mudança de mentalidade no que diz respeito a pesquisa. Ela deixou de ser considerada, pelos nossos dirigentes, como um artigo supérfluo e de luxo, principalmente nas ciências humanas e sociais. É claro que há dificuldades inerentes ao trabalho do pesquisador, mas essas dificuldades todos nós enfrentamos.
Existem mudanças que facilitariam o seu trabalho?
Claro! Fazer pesquisa em uma universidade pública tem muitas vantagens, mas lidamos com a lentidão paquidérmica da burocracia estatal. Costumo dizer que às vezes é mais difícil gastar os recursos do que consegui-los. Outro entrave são os comitês de ética, formados for pessoas bem intencionadas mas mal informadas, que equiparam estudos altamente invasivos e potencialmente danosos com estudos que utilizam um questionário. Além disso, algumas vezes acreditam que devem dizer ao pesquisador que metodologia utilizar sem sequer conhecer a área de trabalho em exame. Isto tem atrasado e prejudicado imensamente o trabalho do pesquisador em ciências humanas.
Qual foi o melhor conselho que você já recebeu?
Mais do que conselhos, o que me ajudou foram exemplos de conduta. De meu orientador, que nunca teve medo de arriscar e sair de sua zona de conforto, para tocar uma investigação inovadora e de resultados altamente incertos. De meus colegas, que nos tempos mais difíceis persistiram fazendo pesquisa e tentando publicar, contra todos os empecilhos.
Você recomenda alguma leitura para quem se interessa pela sua área?
Eu recomendaria o livro que editei junto com a professora Emma Otta, da USP,Psicologia Evolucionista. Porém (e coloque isto na conta das dificuldades), com a edição completamente esgotada, a editora nos avisou que não irá reimprimir o livro por não haver um retorno comercial adequado. Felizmente, há vários outros livros, a maioria traduzidos, interessantes e valem a pena ser lidos, como os de Frank de Waal, Matt Ridley e outros. Claro que se o interesse é mais acadêmico, há necessidade de recorrer aos papers, que são mais atualizados e rigorosos. Publicamos em 2010 um dossiê na revista Estudos de Psicologia que também pode servir de referência a quem quer um primeiro contato com a área.
Esta série de entrevistas é uma parceria entre os blogs SocialMente e Cogpsi. Visite-nos para conhecer um pouco mais sobre psicologia!

O professor Gerson A. Janczura estuda a memória humana no Laboratório de Processos Cognitivos da Universidade de Brasília (UnB). Sendo um dos pioneiros da área, Gerson teve um papel importante na introdução e expansão da psicologia cognitiva no Brasil. Nesta entrevista que ele gentilmente nos cedeu, o professor explorou um pouco do conhecimento que possuímos hoje acerca de como a memória humana funciona, de como somos capazes de formar memórias falsas, das intervenções práticas que a psicologia cognitiva pode subsidiar e das dificuldades que a psicologia cognitiva enfrenta para ganhar espaço no Brasil.


Gerson, você poderia nos falar brevemente sobre os projetos de pesquisa que você tem conduzido no seu grupo de pesquisa? 
A maioria dos projetos desenvolvidos no Laboratório de Processos Cognitivos/UnB estão associados à investigação da Memória Humana. Duas questões centrais de interesse orientam os projetos: a primeira se relaciona à representação mental do conhecimento na memória e, a segunda, sobre a interação entre a Memória e outros Processos Cognitivos. Seguem alguns projetos em andamento:

1)      Normas de Associação Semântica: este projeto está mapeando as redes associativas de material verbal (palavras) que incluem medidas de força associativa, tamanho do conjunto, conectividade e ressonância. A produção deste material permitirá investigar as influências de mecanismos implícitas (e.g., priming) em medidas de memória diretas e indiretas, assim como a sua influência em outros processos cognitivos como o Raciocínio Lógico e a Categorização.

2)      Categorização e Memória: investiga o efeito de mecanismos da memória no desempenho de tarefas que envolvem conceitos e categorias, classicamente conhecidas como “aprendizagem de conceitos”. As questões de interesse se relacionam à aquisição e representação mental de conceitos naturais e artificiais, o efeito da tipicidade em tarefas de classificação, o efeito da força do traço e outras dimensões representacionais em problemas que envolvem o raciocínio dedutivo.

3)      Dicionário de Verbetes da Memória: este projeto está sendo desenvolvido junto ao GT da ANPEPP “Memória: Modelos, pesquisa básica e aplicações” que congrega 9 pesquisadores vinculados a sete universidades no Brasil e Portugal. O livro apresentará mais de 300 verbetes sobre a teoria e pesquisa sobre a Memória, assim como termos da Ciência Cognitiva.

4)      Projetos desenvolvidos junto aos alunos do Mestrado ou Doutorado:
a.       Treino da Memória para Idosos: Este projeto visa desenvolver um programa de intervenção e avaliação da memória para idosos focalizando a reabilitação das funções mnemônicas e a aquisição de estratégias de enfrentamento do comprometimento observado nesta etapa do desenvolvimento humano.

b.      Processo de facilitação e inibição na memória implícita de idosos: O projeto investiga o desempenho da memória na terceira idade verbal focalizando o papel das etapas de processamento implícito no acesso à informação em tarefas que solicitam a recuperação direta do material auxiliada por pistas.

c.       O desempenho de enxadristas em função da especialização e fases do jogo: Este projeto se insere no campo da Resolução de Problemas e Expertise pretendendo colaborar na compreensão das diferenças entre novatos e especialistas, assim como no curso do desenvolvimento da especialização.
d.      Programa de Reabilitação de Indivíduos com Lesão do Plexo: O objetivo deste projeto é desenvolver um programa de intervenção, baseado em técnicas imagísticas e atividades fisioterápicas, para indivíduos que sofreram a lesão do plexo e, em conseqüência, têm os movimentos do braço respectivo comprometido.

E quais são os projetos de pesquisa para o futuro?
Geralmente, os projetos desenvolvidos pelos pesquisadores estão inseridos em Programas de Pesquisa. No Laboratório de Processos Cognitivos da UnB desenvolvemos estudos em dois grandes programas de pesquisa: um programa direcionado ao desenvolvimento de intervenções relacionadas a diferentes tipos de dificuldades cognitivas (por exemplo, problemas relacionados à memória), e outro programa voltado para a pesquisa básica (por exemplo, desenvolvimento da expertise, investigação de dificuldades de leitura, fatores que influenciam o desempenho da memória). Estes programas de pesquisa interagem, isto é, promovemos uma troca entre as pesquisas básica e aplicada.

Como surgiu o seu interesse pela sua área de pesquisa?
Meu interesse na pesquisa psicológica iniciou na época da graduação. Na ocasião, atuava como monitor do Laboratório de Aprendizagem Animal na PUCRS. Este interesse foi se consolidando quando passei a coordenar o Laboratório de Percepção e Psicofísica na mesma IES, e desenvolvi minha primeira pesquisa no campo da Percepção e Psicofísica investigando a Ilusão de Myller-Lyer. Na mesma época, fui convidado para colaborar na montagem do Laboratório de Aprendizagem Animal da UCS/RS. Naquele período não tinha, ainda, entrado em contato com a Psicologia Cognitiva Experimental. O primeiro contato com a área ocorreu quando fiz o mestrado na UnB, na década de 1980. No início do mestrado esperava desenvolver a pesquisa de conclusão seguindo a abordagem da Análise Experimental do Comportamento. Entretanto, experienciava muitas dúvidas e insatisfações teóricas, metodológicas e empíricas com esta perspectiva. Minhas críticas eram semelhantes àquelas relatadas na história da Psicologia Cognitiva nas décadas de 1950 e 1960. Durante o mestrado tive a oportunidade de conhecer a abordagem do processamento da informação e desenvolver minha pesquisa no campo da representação mental do conhecimento.

Alguns dos seus projetos indicam que o conhecimento produzido pela psicologia cognitiva tem permitido o desenvolvimento de intervenções efetivas em indivíduos com prejuízos na memória (e.g. idosos). Conte-nos um pouco sobre este tipo de aplicação da psicologia cognitiva e como tem sido a sua experiência com estas aplicações.
Desenvolvemos um programa de intervenção e avaliação da memória para idosos institucionalizados. Nossa motivação era promover qualidade de vida de um grupo que tem recebido pouca atenção. Os procedimentos, desenvolvidos em sessões com 60 minutos, duas vezes por semana durante quase quatro semanas, evidenciaram que a intervenção melhorou o desempenho em testes de memória. Além disso, foi verificado que os idosos também obtiveram uma avaliação melhor em testes de avaliação neuropsicológica após o treinamento. Os procedimentos implementados no treino de memória foram delineados a partir do conhecimento científicos acerca dos processos da memória e dos fatores que podem favorecer ou dificultar o seu desempenho. Esta proposta será, agora, estendida e ampliada para idosos sem comprometimento cognitivo severo. O termo “envelhecimento cognitivo normal” está associado às características cognitivas observadas na terceira idade que não são atribuídas a condições patológicas como, por exemplo, a Doença de Alzheimer.
Outra derivação tecnológica que estamos desenvolvendo se apóia em estudos experimentais e clínicos sobre a influência da imagística no indivíduo. Pesquisas e a prática clínica têm evidenciado que o uso de imagens mentais pode afetar o comportamento humano e o próprio funcionamento cerebral. Este fato pode ser útil no programa de intervenção que estamos desenvolvendo, baseado em técnicas imagísticas e atividades fisioterápicas, para indivíduos que sofreram a lesão do plexo e, em conseqüência, têm os movimentos do braço(s) respectivo comprometido. A origem desta lesão é, usualmente, acidentes com motocicletas sendo que a maioria dos pacientes com esta condição é homem. Este projeto se encontra em avaliação pelo Comitê de Ética, e será brevemente iniciado. Ou seja, pacientes com esta condição serão submetidos a um programa de exercícios mentais associados a fisioterapia durante um conjunto de sessões. Nossa expectativa é que estes pacientes alcançarão maior recuperação dos movimentos comparados aos pacientes que somente receberão a fisioterapia.

Como você avalia as implicações do avanço das neurociências no estudo de aspectos cognitivos e comportamentais?
As neurociências têm impactado muito positivamente as hipóteses cognitivas sobre o comportamento humano. As evidências produzidas, por exemplos, pelas técnicas de neuroimagem têm confirmado muitas afirmações sobre o funcionamento da mente e evidenciado a necessidade de compreendermos e investigarmos os fenômenos psicológicos em, pelo menos, dois níveis: o nível neurológico e o nível cognitivo. Estes níveis interagem impondo limites mutuamente, tanto no comportamento quando nos modelos teóricos propostos pelos pesquisadores.

Considerando o panorama atual na psicologia cognitiva, o que nós sabemos hoje sobre o que é a memória e como ela funciona?
Trata-se de uma pergunta ambiciosa. A investigação científica da memória começou há mais de 100 anos e tem produzido uma vasta literatura científica que se dedica a relatar nosso conhecimento sobre a memória do ponto de vista cognitivo. Tentarei apontar alguns aspectos que considero relevantes. A memória é uma propriedade do cérebro que permite ao indivíduo manter sua história de aprendizagem ao longo do tempo. Sabemos que vários fatores influenciam a aquisição, retenção e recuperação destes conteúdos. Isto significa que o desempenho da memória pode ser beneficiado ou comprometido por diferentes processos, ou momentos, que designamos de codificação, armazenamento e recuperação. Estes fatores incluem as características da informação a serem memorizadas, as diferenças individuais, a natureza do teste de memória, as estratégias administradas pelo indivíduo no momento da memorização e da recuperação, como a informação é apresentada para memorização, o tempo decorrido entre a experiência e sua lembrança, entre outros fatores. Mas, é importante destacar que, além de suas contribuições individuais, as variáveis que afetam as diferentes etapas podem interagir influenciando a probabilidade de lembrarmos-nos de experiências e conhecimentos.
Um fator que mudou nossa compreensão sobre o funcionamento da memória foi relatado em vários estudos experimentais na década de 1970 com amnésicos e indivíduos sem danos aparentes de memória. Estes estudos mostraram que a chance de um amnésico lembrar informações também era influenciada pela maneira como aqueles pacientes eram testados. Demonstrou-se que os pacientes registravam experiências anteriores mesmo que não tivessem consciência destas no momento em que a memória era avaliada e, apesar disto, aquelas informações estavam influenciando seu comportamento atual. Estes resultados são semelhantes em indivíduos com memória intacta, ou seja, formamos nossas memórias com e sem a participação da consciência e evocamos informações com e sem intenção consciente. Atualmente, nossa compreensão sobre a memória contempla mecanismos conscientes (denominados de processos estratégicos) e inconscientes (denominados de processos automáticos). Neste sentido, a memória também se refere às influências dos conteúdos conscientes e inconscientes e dos mecanismos estratégicos e automáticos sobre o comportamento humano.
Sabemos que este funcionamento está sujeito a falhas incluindo esquecimentos temporários, esquecimentos parciais, e falsas lembranças (ou, falsas memórias). Estes fatos têm sido discutidos em função do caráter construtivo ou reconstrutivo da memória e têm influenciado nossa compreensão sobre diversos fenômenos cotidianos como a testemunha ocular e o depoimento assistido de crianças.
Além dos avanços na compreensão dos processos da memória, a pesquisa tem contribuído na concepção da memória como um sistema. Evoluímos do modelo clássico de um armazenador breve de experiências imediatas (i.e., Memória de Curto-Prazo) para um modelo mais satisfatório (i.e., Memória de Trabalho) que atende às demandas e complexidade das tarefas momentâneas. Vários modelos teórico-experimentais (e.g., MATRIX, PIER2, Modelos Conexionistas, TODAM, ACT*, CONJOINT RECOGNITION, MINERVA, CHARM) estão sendo testados e aprimorados para respondermos às questões fundamentais sobre como o conhecimento é armazenado, como é representado e retido durante longos períodos de tempo (i.e., Memória de Longo-Prazo).
Os comentários acima mencionaram, muito brevemente, apenas detalhes sobre nosso conhecimento atual sobre a memória humana. Vários campos de estudos que não citei incluem avanços nos temas: metamemória, memória sensorial, memória não-declarativa, memória episódica, memória autobiográfica, memória para o espaço e tempo, memória semântica, memória visual, desenvolvimento da memória, distúrbios da memória, memória na terceira idade, memória prospectiva, métodos de investigação da memória, e neurociência da memória.

O testemunho de pessoas que presenciaram determinados episódios (como um assassinato) pode ter um peso considerável no julgamento de um caso. Entretanto, muitas pesquisas na psicologia cognitiva indicam que modificamos frequentemente nossas memórias episódicas quando as recuperamos. Podemos confiar na nossa capacidade de recuperar estes episódios passados?
A observação de que o indivíduo pode gerar falsas memórias não implica que toda recordação seja falha, ou que devemos desconfiar de todas as nossas lembranças. As falsas memórias podem se relacionar a episódios específicos e traumatizantes, como um assassinato, mas também podem refletir experiências comuns do cotidiano. Entretanto, a maioria de nossas recordações é acurada. É importante lembrar que a memória não atua independentemente de outros processos mentais como, por exemplo, o raciocínio, a atenção. Isto significa que uma recordação pode sofrer o “filtro” de outras atividades mentais levando o indivíduo a concluir que determinada memória é falsa, verdadeira ou duvidosa. Além disso, não podemos excluir a contribuição de outros componentes da experiência humana como, por exemplo, a emoção e sua relação com a cognição.

É difícil ser um pesquisador em psicologia no Brasil?
Sim, é difícil. A pesquisa de ponta sobre a cognição humana é cara. Considere, por exemplo, que cada vez mais a pesquisa têm se apoiado em variáveis biológicas. Tanto as variáveis cognitivas quanto as biológicas demandam especialização metodológica de alto custo operacional. Como coletar dados de imagem cerebral sem a aparelhagem apropriada (RMF, fMRI, etc)? Outra dificuldade se relacionada à escassez de especialistas na área no país e ao ensino desta abordagem. Quantos cursos de graduação incluem Psicologia Cognitiva nos cursos de graduação? Quantos cursos de pós-graduação têm linhas de pesquisa e programas de pesquisa nesta abordagem? Apesar de esta perspectiva teórico-metodológica estar consolidada em outros países há muitas décadas, no Brasil somente mais recentemente a área cognitiva tem logrado participação e reconhecimento na comunidade científica e nos meios acadêmicos.

Qual foi o melhor conselho que você já recebeu?
 Um dos conselhos mais úteis que recebi durante meu doutoramento foi sempre “fazer o melhor possível em minhas tarefas”. Este conselho foi dado pelo meu orientador, Dr. Douglas L. Nelson da University of South Florida/USA, lá nos anos 1990.

Você recomenda alguma leitura para quem se interessa pela sua área?
Vários livros sobre a área já estão disponíveis no Brasil. Se a pessoa não tem familiaridade com a área sugiro que leia um manual ou livro texto. Um panorama amplo da área é oferecido por:

- Sternberg, R.J. (2010). Psicologia Cognitiva (Tradução da 5a.ed.). São Paulo: CENGAGE.
- John R. Anderson (2004), Psicologia Cognitiva e suas Implicações Experimentais, 5a. Edição, Editora LTC.
- Matlin, M. (2004). Psicologia Cognitiva. 5. ed. São Paulo: LTC.
Se a pessoa tem interesse em Terapia Cognitiva, sugiro que inicie com a leitura de:
- Beck, J. S. (1997). Terapia Cognitiva: Teoria e Prática. Porto Alegre: ARTMED.

Esta série de entrevistas é uma parceria entre os blogs SocialMente e Cogpsi. Visite-nos para conhecer um pouco mais sobre psicologia

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